O critério da Vida:
Friedrich Nietzsche (1844-1900) procedeu a um deslocamento do problema do conhecimento, alterando o papel da filosofia. Para ele, o conhecimento não passa de interpretação, de atribuição de sentidos, sem jamais ser uma explicação da realidade. Conferir sentidos é, também, conferir valores, ou seja, os sentidos são atribuídos a partir de determinada escala de valores que se quer promover ou ocultar.
A tarefa da filosofia é a de interpretar a escrita de camadas sobrepostas das expressões e gestos humanos. O trabalho interpretativo volta-se, em primeiro lugar, para o exame do conjunto do texto metafisico, a fim de desmascarar o modo pelo qual a linguagem passou do nomear as coisas concretas para o sistematizar verdades eternas.
Como método de decifração, Nietzsche propõe a genealogia, que coloca em relevo os diferentes processos de instituição de um texto, mostrando as lacunas, os espaços em branco mais significativos, o que não foi dito ou foi reprimido e que permitiu erigir determinados conceitos em verdades absolutas e eternas. A genealogia( questionamento da origem dos valores), portanto, visa a resgatar o conhecimento primeiro e que foi transformado em verdade metafisica, estável e intemporal. Mas a vida é um devir- está sempre em movimento e, portanto, não é possível reduzi-la a conceitos abstratos, a significados estáveis e definitivos.
Para Nietzsche, o conhecimento resulta de uma luta, de um compromisso entre instintos. Pelo procedimento genealógico, ao compreender a avaliação que foi feita desses instintos, descobre que o único critério que se impõe é a vida. O critério da verdade, portanto, deixa de ser um valor racional para adquirir um valor de existência. O que Nietzsche quer dizer com critério da vida? Ao fazer o exame genealógico, pergunta-se que sentidos atribuídos às coisas fortalecem nosso querer-viver e quais o degeneram. Enfim, a interpretação genealógica questiona os valores para saber o que nos fortalece vitalmente e o que nos enfraquece.
A esse respeito, a professora Scarlett Marton cita Nietzsche:
" Fazer qualquer apreciação passar pelo crivo da vida equivale a perguntar se ela contribui para favorece-la ou obstrui-la, submeter ideias ou atitudes ao exame genealógico é o mesmo que inquirir se são signos de plenitude de vida ou da sua degeneração, avaliar uma avaliação, enfim, significa questionar se é sintoma de vida ascendente ou declinante".
Friedrich Nietzsche dá o exemplo da dificuldade de se dizer o que é a honestidade. Pois nada sabemos de uma qualidade essencial que chame a honestidade, mas sabemos, isso sim, de numerosas ações individualizadas, portanto desiguais. Ao reunir todas elas sob o conceito de honestidade, estamos diante de uma abstração. O que se perde nesse processo é que, ao colocar seu agir sob regência das abstrações, as instituições são desprezadas para privilegiar o conceito.
Como conhecemos, então? Para Nietzsche, o conhecimento se vale da metáfora. Se na linguagem comum a metáfora é um ornamento e como tal não tem significado de conhecimento propriamente dito, para ele a metáfora assume um caráter cognitivo. Só ela consegue perceber as coisas no seu devir permanente, porque cada metáfora intuitiva é individual, e, por isso, escapa ao grande edifício dos conceitos. O conceito, por sua vez, nada mais é do que o resíduo de uma metáfora.
Assim diz Friedrich Nietzsche:
" O que é a verdade, portanto? Um batalhão móvel de metáforas, metonímias, antropomorfismos, enfim, uma soma de relações humanas, que foram enfatizadas poética e retoricamente, transpostas, enfeitadas, e que, após longo uso, parecem a um povo sólidas, canônicas e obrigatórias: as verdades são ilusões, das quais se esqueceu que são, metáforas que se tornam gastas e sem força sensível, moedas que perderam sua efígie e agora só entram em consideração como metal, não mais moedas".
Outro aspecto do caráter interpretativo de todo conhecimento é a teoria do perspectivismo, que consiste em perseguir uma ideia a partir de diferentes perspectivas. Essa pluralidade de ângulos não nos leva a conhecer o que as coisas são em si mesmas, mas é enriquecedora por nos aproximar mais da complexidade da vida em seu movimento.
Exercícios:
1- O que Nietzsche quer dizer com: A verdade é um batalhão de metáforas ou as verdades são ilusões? O que essas afirmações representaram para a teoria do conhecimento contemporânea?